Por Michele Ferreira, publicado no
sitio do Diário Popular.
Em cinco anos, os 22 municípios da região atingiram 58,82 mortes por cem
mil nascidos vivos, enquanto a Organização Mundial da Saúde estabelece
que o número de 20 óbitos como aceitável
A mortalidade materna, uma das oito
Metas de Desenvolvimento do Milênio, causa preocupação também na Zona
Sul. Em cinco anos, 36 mulheres morreram entre os 22 municípios que
integram a 3ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), onde nasceram
61.207 bebês. O dado pode até não soar alarmante, mas quando aplicada a
fórmula para obter a Razão de Mortalidade Materna (RMM) - cálculo
aplicado em todo o mundo -, chega-se a 58,82 mortes por cem mil nascidos
vivos; quase três vezes mais do que o aceitável pela Organização
Mundial de Saúde (OMS).
O alerta faz parte da dissertação de
mestrado da enfermeira Ana Amália Pereira Torres, que apresenta o estudo
hoje, às 17h30min, para a equipe do Núcleo de Pesquisa da Criança, do
Adolescente, da Mulher e Família da Faculdade de Enfermagem da
Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Profissionais da 3ª CRS também
estão convidados a participar.
"É fundamental uma assistência integral,
que vá do planejamento familiar, passe pelo pré-natal e permaneça com
cuidados ao recém-nascido, mas também a essa mãe", enfatiza. Em um ano e
nove meses, Ana Amália analisou relatórios dos Sistemas de Informação
sobre Mortalidade (SIM) e sobre Nascidos Vivos (Sinasc). Os prontuários
de investigação de morte materna abertos pelos municípios também
serviram de fonte de informação e checagem de dados.
A proposta
foi cumprida: a agora mestre em Ciências conseguiu estabelecer um perfil
dessas 36 mulheres. A falta de detalhamento nos atestados de óbito
desponta como uma das principais reflexões. Em 12 casos, o documento não
apresentava a causa específica da morte. Uma informação relevante que,
extraída do papel e transformada em levantamento epidemiológico, pode
ajudar a dar rumo às novas políticas públicas de prevenção e de combate à
mortalidade materna.
"É o que buscaremos a partir de agora,
com a caracterização desses 36 óbitos", ressalta a orientadora da
pesquisa, a doutora em Saúde Pública Marilu Correa Soares. A intenção de
centrar o foco em um período de dez anos e não de cinco como ocorreu,
teve de ser alterada devido a mudanças no software do SIM e do Sinasc,
que impediram o acesso aos relatórios. O estado de saúde dos
recém-nascidos, cujas mães morreram, também não estava disponível em
nenhuma das fontes previstas na metodologia da pesquisa.
Cuidado ampliado às mães
Os
secretários de Saúde dos 22 municípios da Zona Sul estarão reunidos na
quarta-feira, às 14h, em encontro da Comissão Intergestores Regional
(CIR), no auditório do Centro de Eventos Fenadoce. A pauta, extensa,
prevê debate sobre a Rede Cegonha, que tem a finalidade de estruturar e
organizar a atenção à saúde materno-infantil em todo o país.
A intenção é de que seis hospitais de
pequeno porte - nas cidades de Pedro Osório, Pedras Altas, Morro
Redondo, Santana da Boa Vista, Herval e Amaral Ferrador - não realizem
mais partos, naturais ou de cesárea. As gestantes serão direcionadas a
instituições de referência, possivelmente definidas por critérios, como a
proximidade geográfica.
Os outros hospitais, que irão absorver
essa demanda, deverão receber incentivo financeiro de, no mínimo, R$ 40
mil, por mês. "Será uma verba para poderem investir em plantão
presencial de profissionais, como obstetra, pediatra e anestesista",
ressalta o titular da 3ª CRS, Milton Martins. Para liberação dos
recursos a essas instituições, entretanto, a projeção deve ser de, pelo
menos, um parto por dia. É um dos temas a serem tratados e pactuados
nesta semana para dar origem à Resolução com todo o regramento a ser
adotado.
Desafio
A
mortalidade materna, até hoje, está entre os problemas de saúde pública
nos países em desenvolvimento. No Brasil, em 1990, 141 mulheres morriam
para cada cem mil nascidos vivos. Duas décadas depois, em 2010, a Razão
de Mortalidade Materna (RMM) havia caído para 68. Até o próximo ano,
dentro das Metas de Desenvolvimento do Milênio, o Brasil deveria reduzir
o índice para 35 mortes por cem mil nascidos vivos. Pela OMS, o
aceitável seriam 20. Fica, portanto, a expectativa.
O que caracteriza a mortalidade materna?
São
mortes ocorridas durante a gestação, no momento do parto, em caso de
aborto e no puerpério, isto é, até o 42º dia após o parto. Os óbitos
devem estar relacionados, de alguma forma, à gravidez. Situações em que
as mulheres se envolvem em acidentes ou incidentes não integram as
estatísticas de mortalidade materna.
Período analisado na pesquisa: 2007 a 2012
Área de abrangência: 22 municípios da 3ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS)
Nascidos vivos: 61.207 bebês
Morte materna: 36
Entenda melhor:
as 36 mortes equivalem a 58,82 óbitos a cada cem mil nascidos vivos.
Para se chegar à Razão de Mortalidade Materna (RMM) - cálculo aplicado
em todo o mundo - divide-se o total de mortes pelo número de nascidos
vivos. Neste caso, 36 divididos por 61.207.
Fontes pesquisadas: os
dados foram captados junto aos Sistemas de Informação sobre Mortalidade
(SIM) e sobre Nascidos Vivos (Sinasc), com apoio da 3ª CRS que emprestou
códigos de acesso, já que cidadãos que não pertencem a instituições
ligadas ao governo esbarram na limitação de dados. Os prontuários de
investigação de morte materna também foram repassados pelos municípios
por intermédio da 3ª CRS.
Orientação: o estudo da
enfermeira Ana Amália Pereira Torres, desenvolvido pelo Programa de
Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de
Pelotas (UFPel), teve a orientação da professora Marilu Correa Soares.
Onde viviam as vítimas?
Mortes Nascidos vivos
Arroio Grande: 2 1.272
Capão do Leão: 2 1.857
Cristal: 1 524
Pelotas: 14 24.465
Piratini: 1 1.200
Rio Grande: 7 15.340
Santa Vitória: 2 2.182
São José do Norte: 6 1.776
São Lourenço do Sul: 1 2.811
Qual o perfil dessas 36 mulheres?
- Faixa etária: 52,78% tinham entre 30 e 39 anos
- Cor: 77,77% eram brancas
- Estado civil: 55,55% eram solteiras
- Ocupação: 55,56% eram donas de casa
- Grau de escolaridade: só havia informação sobre metade das vítimas. Dessas 18, 41,67% possuíam Ensino Fundamental
- Período gestacional: 69,44% estavam entre a 32ª e a 41ª semanas de gestação
- Outros filhos: 52,78% já tinham entre um e três
-
O parto: 50% das mulheres tinham feito cesárea, o que não significa que
as mortes ocorreram em decorrência de complicações no procedimento
- A gravidez: 94,44% das gestantes esperavam apenas um bebê
Causa das mortes
- Obstétrica direta: 41,37% - 15 casos
Desses 15 óbitos, em 26,67% dos casos, as mulheres morreram de hemorragia
- Obstétrica indireta: 25% - Nove casos
São originadas por complicações de alguma situação que a mulher já possuía.
Desses nove óbitos, 22,22% foram em decorrência de doenças circulatórias e 22,22% em função de problemas respiratórios.
- Obstétrica não especificada: 33,33% - 12 casos
- Local da morte: 88,89% delas estavam em ambiente hospitalar.
As metas do Milênio
Em
2000, ao observar os maiores problemas ao redor do mundo, a Organização
das Nações Unidas (ONU) estabeleceu oito Metas de Desenvolvimento do
Milênio. 189 países aceitaram o desafio. No Brasil, elas passaram a ser
chamadas de oito jeitos de mudar o mundo. Veja quais são eles.
1 - Acabar com a fome e a miséria
2 - Educação Básica de qualidade para todos
3 - Igualdade entre sexos e valorização da mulher
4 - Reduzir a mortalidade infantil
5 - Melhorar a saúde das gestantes
6 - Combater a Aids, a malária e outras doenças
7 - Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente
8 - Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento